Após ter participado da criação da performance Feminino Abjeto, de Janaina Leite, o artista cênico transmasculino Oliver Olívia criou uma série de espetáculos cênicos que partem de discussões sobre sua transição de gênero. Para Oliver, a ideia era mirar em lugares que trouxessem contradições. Foi dessa forma que nasceram Não ela: o que é bom está sempre sendo destruído, Ele e Culpa, os três componentes do Tríptico: Não ela, Ele e Culpa, que estreia dia 6 de julho, com sessões até 22 de julho, na Oficina Cultural Oswald de Andrade (Rua Três Rios, 363 – Bom Retiro, São Paulo; de 10 a 27 de agosto a temporada é no Teatro Arthur de Azevedo (Av. Paes de Barros, 955 – Alto da Mooca, São Paulo).
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Após as sessões da temporada do Tríptico serão feitas conversas com convidadas que são artistas e pensadoras do teatro. São elas Dodi Leal (6, 7 e 8 de julho), Helena Vieira (13, 14 e 15 de julho) e Janaina Leite (20, 21 e 22 de julho). Após as apresentações, as convidadas conduzirão um ambiente de conversa entre elas, os artistas e o público. O intuito é a troca e reflexão entre todes, com a provocação do olhar das convidadas.
Oliver conta que o início do processo de criação que culminou na obra Não ela: o que é bom está sempre sendo destruído foi feito a partir de um dispositivo de escrita automática, um material criado a partir de textos feitos por Lucas Miyazaki, escritor e namorado de Oliver, sobre como ele estava lidando com o corpo de seu parceiro no momento da transição de gênero. A proposta foi convidar Lucas para o palco, criando cinco cenas que partiram das discussões e reflexões do casal, composto por um homem cisgênero e uma pessoa transmasculina.
Na sequência, já em uma etapa de transição marcada por mudanças expressivas em seu corpo por conta do uso de testosterona, Oliver criou Ele, uma peça sem texto composta por cinco imagens coletadas da convivência do artista com seu namorado Lucas. Nelas, ambos fazem a barba um do outro, praticam jiu-jitsu e discutem, por meio de outras ações, questões que tangenciam discussões sobre sexualidade e gênero, compondo uma obra de forte apelo visual.
Pensando que as duas peças criavam um díptico, Oliver concluiu que ainda havia outro estudo cênico a ser criado e, dessa vez, decidiu trazer ao palco Rosana e Eugênio, seus pais. Culpa é uma obra composta por cenas inspiradas nos embates e nas vivências familiares do artista disparadas pela mastectomia masculinizadora (retirada plástica dos seios) realizada por Oliver, sem que seus pais soubessem.
O artista reforça que todas as obras – criadas tendo base o biodrama, termo cunhado pela diretora argentina chamada Vivi Tellas que consiste na fricção da realidade com a ficção -, foram elaboradas em meio ao seu processo de transição de gênero e de hormonização, gerando assim trabalhos concebidos durante as mudanças aprofundadas que o processo de transição de gênero causou e causa em Oliver e nas pessoas ao seu redor, como sua família e seu companheiro.
“Há uma linha estética comum nos três espetáculos, como projeções de textos e jogos performativos que vão sendo executados de modos diferentes a cada sessão, e não por meio de cenas marcadas. Também não há uma trilha sonora num sentido muito convencional, de embalar alguma atmosfera. O que predomina também nos trabalhos é uma moldura teatral para algo não convencionalmente teatral”, conta Oliver, reforçando que um dos atravessamentos fundamentais nos trabalhos foi a leitura de Testo Junkie, obra do escritor e filósofo transmasculino espanhol Paul B. Preciado, que também foi concebido enquanto Paul fazia uso de testosterona.
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