Em um resgate histórico da participação das mulheres na Independência do Brasil, a exposição “Mulheres que mudaram 200 anos” reconta o protagonismo feminino no período.
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A mostra, em atividade em sete cidades das unidades da Caixa Cultural, tem direção curatorial de Marina Bortoluzzi, fundadora da plataforma Women On Walls, com assistência das curadoras Ana Carla Soler e Bianca Zaltman, assistência de curadoria de conhecimento e pesquisa de Antonilde Rosa, Nutyelly Cena e Karla Fagundes, historiografia de Mary del Priore, projeto expográfico de Brotô arte e projetos (Virginia Manfrinato e Bárbara Ávila) e ilustração de Daniela Hasse Coutinho.
A exposição, trabalhada em tempo espiralar, tem como objetivo retomar e eternizar a narrativa que abrange as mulheres que romperam paradigmas sociais e morais do século XIX, e que contribuíram para a transformação dos últimos 200 anos. A expografia é dividida através de quatro núcleos: Resgate, Relevância & Retomada, mobiliário interativo com a biografia e importância de cada personagem; Rizoma, uma instalação que promove o encontro e identificação com as homenageadas; Repintar a História, que recebe as obras das artistas convidadas; e Reflexões, um mobiliário educativo de combinação para a desconstrução crítica que traz contextualizações de civilização, Brasil e Independência.
Sob o olhar de mulheres com múltiplas subjetividades, 36 obras foram produzidas pelas artistas: Alexsandra Ribeiro, Aline Bispo, Aline Motta, Anna Menezes, Azuhli, Camilla Siren, Clara Moreira, Dani Rampe, Emanuela Boccia, Erika Lourenço, Fernanda Rodrigues, Guilhermina Augusti, Heloísa Marques, Isabela Seifarth, Janaína Vieira, Jess Vieira, Joana Lira, Joana Uchôa, Keila Sankofa, Maré de Matos, Maria Flexa, Mariê Balbinot, Moara Tupinambá, Mônica Barbosa, Mônica Ventura, Òkun, Olga Carolina, Pati Rigon, Renata Felinto, Sallisa Rosa, Silvie Eidam, Stefany Lima, Terezadequinta, Terroristas del Amor (Dhiovana Barroso e Marissa Noana), Thaís Iroko e Thaiz Zafalon.
A exposição celebra personagens que tiveram relação direta ou indireta com a efeméride da Independência: lideranças femininas que representam a diversidade de múltiplas realidades, classes, raças e orientações sexuais; ancestrais brancas, negras, indígenas e sertanejas. Entre elas: Hipólita Jacinta de Teixeira de Melo, Bárbara Alencar, Urânia Vanério, Joana Angélica, Ana Lins, Mariana Crioula, Maria Joaquina de Almeida, Maria Josephine Matilde Duroche, Madalena Tupinambá, com destaque na mostra para Maria Leopoldina, Maria Quitéria, Maria Felipa e Nísia Floresta.
Maria Leopoldina (1797 – 1826)
Maria Leopoldina foi a primeira mulher a estar no poder do Brasil e que propôs um novo projeto para o país. Apesar de estar submetida a um relacionamento abusivo, superou suas dores e barreiras e conquistou admiração do povo, que lhe enalteceu e lhe posicionou como uma personalidade central na história da Independência do país. Ilustrada em pintura óleo sobre a tela pela multiartista Pati Rigon, para a mostra de São Paulo, a obra “Sobre Ficar” (2022), retrata a imperatriz coberta de elementos da fauna e flora nacionais – mapeadas e estudadas com o intermédio dela – que demonstraram sua paixão e o desejo de fazer dessa terra a sua casa. Já sob o olhar iconográfico da artista e designer, Joana Lira, Recife recebe o retrato “Leopoldina Olhos de Águia” (2022), que debruça sobre sua perspicácia, decisiva para o momento que transformaria o destino do país. No Rio de Janeiro, Maria Flexa faz o retrato de Maria Leopoldina grávida com “Mãe de Milhares”. Os nove anos que a Imperatriz passou no Brasil, até a sua morte, foram marcados por gestações e puerpérios de sete crianças. Entre os adornos florais nas margens do quadro, está a “mãe de milhares”, erva daninha típica dos canteiros cariocas, muito fértil.
Maria Felipa de Oliveira (s/d – 1873)
Maria Felipa foi símbolo de luta e transgressão por direitos entre as mulheres negras que protagonizaram marcos históricos. Liderou grandes grupos, incluindo os povos indígenas, combate aos processos coloniais, e expulsou as tropas portuguesas da Bahia, contribuindo para um grande marco na Independência. A obra “Maria Felipa em Escuro Indizível” (2022), pela artista plástica Guilhermina Augusti, constrói retrato de Maria Felipa, ao Rio de Janeiro, na união rostos de mulheres negras do século XIX que, ao contrário dela, possuem algum registro histórico, somado a elementos adinkras e símbolos oriundos do Gana. Em Fortaleza, a obra “A Conquista do Amanhã” de Renata Felinto, feita em um estandarte, traz consigo a ideia de bandeira, que apresenta um grupo de luta. O “Brasil” escrito no facão faz alusão à luta pela sua libertação. O brinco de Maria Felipa contém o adinkra Sankofa, que significa “voltar atrás e buscar o que esqueceu”, uma referência ao povo akan, de Gana. Em São Paulo, no retrato de Maria Felipa criado por Aline Bispo na “Maria Felipa, Encantada”, a heroína aparece cercada por peixes, memória do local de onde conseguia o seu sustento, o mar. A personagem era conhecida como marisqueira, pescava e vendia o fruto de seu trabalho.
Maria Quitéria de Jesus (1792 aprox. – 1853)
Maria Quitéria foi a primeira mulher a fazer parte do Exército Brasileiro, e considerada heroína da Independência. Fingindo ser homem para entrar nas forças armadas e combater a tropa portuguesa, inspirou outras mulheres a entrarem no campo de batalha e reforçar que a mulher deve estar onde ela deseja ocupar. Salvador recebe o retrato da baiana, realizado pela artista visual Emanuela Boccia, que estampa na obra “Entre a agulha e a espada” (2022) a frase “o coração me abrasa”. Em Brasília, a mostra recebe a obra da fotógrafa e artista plástica Anna Menezes, que traz a releitura da guerreira na pedra São Tomé, com a espada de São Jorge, com menção à luta e a relação da guerreira com as religiões afro-brasileiras. O coletivo Terroristas Del Amor, traz para Fortaleza a obra “Maria” (2022), onde misturam Maria à sua própria identidade, evocando a liberdade de seus corpos ementes em conexão com o coletivo.
Nísia Floresta Brasileira Augusta (1810 – 1885)
Nísia Floresta foi uma escritora e educadora nordestina, e uma das percursoras do feminismo no Brasil. Na vida pessoal foi vítima da sociedade patriarcal, sendo repudiada por abandonar um casamento precoce, aos treze anos. Aos 25, fundou um colégio voltado exclusivamente para mulheres. Intelectual e revolucionária, transcendeu os limites impostos da sua época e lutou, através da literatura e da educação, pela emancipação da independência das mulheres. Na mostra de São Paulo, Nísia é retratada como Johanna Stein pelas mãos da artista Olga Carolina, na obra “Camafeu” (2022), através da pintura à óleo sobre tela, tule e renda. Em Salvador, Heloísa Marques cria um retrato de Nísia através da linha e da agulha do bordado, regida pela marcha lenta do tempo, resgata a memória tátil das gerações que vieram antes de nós. Em Fortaleza, Azhuli retrata Nísia Floresta com um mergulho em sua trajetória de luta, porém com um olhar suave e sereno, como quem sabe exatamente aonde quer chegar.
Apontando as mulheres como a fundação e parte da construção do Brasil, a exposição ainda apresenta obras que estão expostas em todas as cidades, como da artista Aline Motta que traz em vídeo a obra “Filha Natural” (2018/2018), com hipóteses sobre as origens de sua tataravó, possivelmente nascida em 1855 no epicentro do escravismo brasileiro no século XIX; a obra “Mirasawá” (2022) da artista visual Moara Tupinambá, que mostra uma série de colagens em fotos das mulheres originárias de Abya Yala, para ressignificar imagens feitas por etnólogos que não tiveram o devido cuidado em identificar corretamente os nomes dos indígenas e de seus povos; e a obra ‘’Pilar” (2022) da artista contemporânea Mônica Ventura, que com sua instalação reforça que as mulheres foram o pilar para a mudança nos últimos 200 anos da sociedade brasileira.
A mostra “Mulheres que mudaram 200 anos” retoma o trabalho da Caixa Cultural, e apresenta obras que se manifestam em forma de pinturas, desenhos, bordados, esculturas, fotografias, colagens, vídeos, instalações e bandeiras, além de contar com um mobiliário interativo idealizado pela curadora Marina Bortoluzzi e a arquiteta Virginia Manfrinato. Aberta para visitação até o dia 16 de abril, está disponível nas unidades da Caixa Cultural em sete cidades: São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Fortaleza, Recife, Salvador e Curitiba. A entrada é franca, com funcionamento de terça à domingo, dentro dos horários determinados por cada estado. Mais informações podem ser consultadas através do site da CAIXA Cultural.
Ficha técnica
Mulheres que mudaram 200 anos
Visitação: Até 16/04, entrada gratuita
Realização: Caixa Cultural
Direção Curatorial: Marina Bortoluzzi
Assistência de Curadoria: Ana Carla Soler e Bianca Zaltman
Assistência de Conhecimento e Pesquisa: Antonilde Rosa, Nutyelly Cena e Karla Fagundes
Historiografia: Mary del Priore
Produção: Agência EA
Projeto Expográfico: Brotô arte e projetos – Virginia Manfrinato e Bárbara Ávila
Ilustrações: Daniela Hasse Coutinho