Uma novela escrita às pressas para substituir outra. Em apenas três meses, uma autora teve de erguer do nada uma trama que aproveitasse elenco e equipe da produção que não pôde ir ao ar. O resultado foi um dos maiores sucessos da TV brasileira, e que tornou-se um clássico.
Tudo começou em 1975. O governo da ditadura militar censurou a novela Roque Santeiro, de Dias Gomes, produzida pela TV Globo para o então horário das 20h, em pleno dia da estreia. Os militares haviam descoberto que Roque era uma versão para TV da peça teatral O Berço do Herói, também de Dias. A peça havia sido censurada anos antes, por fazer “pirraça” do exército brasileiro.
Para cobrir o buraco na grade de exibição, a Globo colocou no ar uma reprise compacta de Selva de Pedra (1972/73), de Janete Clair, e convocou a própria Janete para escrever uma substituta a toque de caixa. A “maga das oito”, como era conhecida, não fugiu à luta e criou Pecado Capital, que enfim estreou em novembro de 1975.
A história criada por Janete era uma reflexão sobre o capitalismo e a postura da sociedade brasileira em sua neurótica relação com o dinheiro. O motorista de táxi Carlão (Francisco Cuoco) recebe em seu carro uma quadrilha que acaba de assaltar um banco. Mas na fuga, os bandidos esquecem no táxi o produto do roubo: uma mala recheada de dinheiro.
O dilema do motorista pobretão: entregar o dinheiro à polícia ou enriquecer às custas da fortuna, investindo em uma frota de táxis? Ao mesmo tempo, sua namorada, a operária Lucinha (Betty Faria) vira modelo e manequim e passa a ser cortejada pelo milionário Salviano Lisboa (Lima Duarte). Claro que Carlão, para competir com o ricaço, escolhe a segunda opção de seu dilema.
A novela foi um grande sucesso de audiência, numa época em que a Rede Globo reinava absoluta na audiência. Em plena ressaca da ditadura militar, Janete ousava criticar o chamado “milagre econômico” divulgado pelo governo, e expunha as mazelas da população de baixa renda nas grandes metrópoles do país.
A luta de Carlão para enriquecer era a luta de todos os brasileiros, sempre em dúvida se devem ou não ser honestos e descartar a chance de vencer na vida. Uma reflexão que foi abordada com ainda mais força em Vale Tudo (1988/89, de Gilberto Braga e Aguinaldo Silva), anos depois.
Emoldurada pela inesquecível canção de abertura de Paulinho da Viola (“Dinheiro na mão é vendaval…”), Pecado Capital foi a primeira novela a cores transmitida pela Globo no horário das 20h, marcou época e volta agora, em versão compacta, no box com 10 DVDs e 30 horas de duração que a Globo Marcas acaba de colocar no mercado, pelo preço médio de R$164.
E logo mais, Pecado Capital volta também à TV, mas através de seu remake. Escrito por Glória Perez e exibido pela Globo às 18h entre outubro de 1998 e maio de 1999, o remake foi uma tentativa de reacender o sucesso da novela original.
Mas tal objetivo não foi atingido. O principal problema do remake era a escalação de Francisco Cuoco (o Carlão da versão 75) para o papel de Salviano Lisboa. Se no original Salviano era um viúvo de cinquenta anos ainda com porte de galã maduro, o remake trouxe um Cuoco com 65 anos de idade, já bastante inadequado para a faixa etária do personagem. E o par romântico com Carolina Ferraz – a Lucinha do remake – não funcionou: eram 40 anos de diferença entre os dois.
Completando o triângulo, Eduardo Moscovis viveu Carlão. A escalação aproveitava o repentino sucesso da dupla Moscovis e Carolina, que tinham acabado de interpretar Nando e Milena em Por Amor (1997/98, de Manoel Carlos).
O remake de Pecado Capital acabou não agradando, e nunca foi reprisado pela Globo. Ganha agora uma segunda chance com a reprise no Canal Viva, programada para estrear em novembro, no horário atualmente ocupado por História de Amor (1995/96).