James Cameron, o Rei do Mundo
“Blame Canada! Blame Canada!” (Culpem o Canadá). O grito de guerra de uma das músicas mais hilariantes do longa de animação South Park: Maior, Melhor e sem Cortes (1999) bem poderia servir para algum crítico da Hollywood atual. Afinal, a era dos mega-blaster-blockbusters está mais forte do que nunca. E o culpado é um canadense: James Cameron.
O diretor completa 60 anos de idade neste sábado (16), instalado em uma posição invejável: ele é o grande piloto do cinema de ação que continua rendendo milhões nas bilheterias. Através de suas produções megalomaníacas, ele fundou os alicerces dos intermináveis blockbusters que continuam sendo produzidos a rodo nos EUA.
Praticamente todos os adeptos de tais filmes devem muito a Cameron: de Michael Bay com sua franquia Transformers até a saga Velozes e Furiosos, passando por franquias como Homem-Aranha e Homem de Ferro (aliás, incluindo todos os filmes de heróis), X-Men e até Sylvester Stallone com a série Mercenários.
Mas em que sentido toda essa produção bebe na fonte de Cameron? Resposta: no conceito (equivocado) de que “mais é mais”. Mais efeitos, mais trucagens, mais trabalho, mais retoques, mais computadores, e mais, muito mais dinheiro – no orçamento e na bilheteria. A velha ideia (também equivocada) de que se uma coisa é cara ela tem qualidade.
James Cameron começou a desenhar tal conceito com o filme O Segredo do Abismo (1989): uma produção complicada, repleta de excessos nos bastidores e na finalização, que custou cerca de US$70 milhões (uma fortuna para a época) e rendeu, no mundo todo, US$90 milhões.
Até então, Cameron era visto como um realizador promissor que havia dirigido, como diretor contratado, o fiasco trash Piranhas 2: Assassinas Voadoras (1981), mas que tinha como trunfo o surpreendente O Exterminador do Futuro (1984) – uma produção quase B, que custou US$6 milhões e rendeu quase US$40 milhões; e de quebra revitalizou a carreira de Arnold Schwarzenegger.
O sucesso do Exterminador rendeu a Cameron o convite para pilotar Aliens, o Resgate (1986, sequência do filme de Ridley Scott de 1979). Depois veio O Segredo do Abismo, projeto acalentado durante anos pelo diretor – enfim ele tinha dinheiro e infra para fazer o filme que queria.
Depois vieram mais dois filmes com Schwarzenegger – O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final (1991) e True Lies (1994). Ambos continuavam no caminho de crescimento total: aumentavam os orçamentos, as bilheterias, os efeitos, as loucuras tecnológicas inventadas por Cameron.
Até que veio o filme que mais uma vez surpreendeu os fãs de Cameron: Titanic (1997). Um blockbuster de ação (sim) e ao mesmo tempo um grande melodrama lacrimoso e folhetinesco. Mais uma vez, e definitivamente, “mais era mais”: mais dinheiro (orçamento de US$200 milhões), mais efeitos, mais requinte de superprodução (os detalhes de objetos de cena e demais artefatos do Titanic cenográfico mereceriam uma tese à parte), mais ação, mais mortes dramáticas, mais lágrimas.
E finalmente, mais Oscars do que nunca: Titanic concorreu a 14 estatuetas e ganhou 11. Igualando-se assim ao clássico A Malvada (1950, que concorreu a 14 Oscars e ganhou 6), e empatando com Ben-Hur (1959) e O Senhor dos Anéis – O Retorno do Rei (2003), que levaram, também, 11 Oscars cada. Na cerimônia de entrega, Cameron gritou a frase que o personagem de Leonardo DiCaprio dizia no filme: “I’m the king of the world!” (Sou o rei do mundo).
Outra coisa que aumentou, após o furacão Titanic: o tempo de preparação para o próximo projeto. Cameron levou 12 anos para lançar seu filme seguinte: Avatar (2009).
Avatar, claro, dispensa apresentações. Com a saga dos seres azuis, Cameron avançou ainda mais em todos os sentidos – e desta vez, a bordo do 3D, bugiganga hoje quase obrigatória em qualquer blockbuster que se preze.
O orçamento do faraônico Avatar foi de US$237 milhões – e rendeu US$2,787 bilhões. Até o momento, Avatar segue no posto de filme de maior bilheteria em toda a história do cinema. A propósito: o segundo lugar pertence a Titanic, com US$2,186 bilhões.
Até se poderia imaginar que, depois do sucesso monstruoso de Avatar, Cameron optasse por fazer um caminho inusitado: partir para produções simples e baratas, resgatando o frescor de um filme como O Exterminador do Futuro. Mas não há limites para Cameron: ele volta a atacar com simplesmente três continuações de Avatar.
A trinca está sendo produzida simultaneamente, e com datas de estreias marcadas: 2016, 2017 e 2018. Uma linha de montagem de blockbusters.
E assim, o “Rei do Mundo” segue ampliando seus domínios e seu poder, criando discípulos e fazendo história. Mas, como já apontam alguns críticos visionários, a tendência é que a decadência chegue a qualquer momento – como aconteceu com grandes impérios e seus comandantes: Alexandre o Grande, Napoleão, Nero, Júlio César, Cleópatra…
A queda de Cameron e da famigerada era dos blockbusters megalômanos que habitam a Hollywood atual pode ser a grande virada do cinema nos próximos anos.
Se isso acontecer, espera-se que Hollywood se reinvente, buscando a força em bons roteiros, interpretados por atores de verdade (e não pelas peças de engrenagem que “atuam” nos blockbusters) e com direções firmes que privilegiem contar uma história. Sem efeitos, sem milhões, sem 3D, sem parafernália. Apenas cativar as plateias, como faziam os contadores de “causos” em volta da fogueira na pré-história da humanidade.