O cerco não está se fechando apenas para os maiores de idade. Após a lei seca e a lei antifumo, agora o toque de recolher também está se popularizando nas cidades do interior de São Paulo.

No dia 20 de abril, foi anunciado que os menores de idade não poderão ficar nas ruas e em outros locais públicos, como shopping centers, depois das 23 horas em Mirassol, Itapura e Ilha Solteira. Numa ação conjunta entre o Conselho Tutelar e a Vara da Infância e Juventude, a nova medida tem por objetivo reduzir os casos de violência.

A cidade paulista Fernandópolis é uma das pioneiras no toque de recolher e, nesta semana, após quatro anos que a medida vigora na cidade de 62 mil habitantes, foi anunciado que houve uma redução de 80% dos atos infracionais e de 82% das reclamações do Conselho Tutelar. Para as autoridades, o responsável pela redução destes números é o toque de recolher.

Entretanto, a medida tem divido opiniões de especialistas e até dos pais de crianças ou adolescentes. O BATE/REBATE desta semana convidou duas autoridades sobre assunto para debater se a medida é sim uma boa saída ou apenas uma maneira evitar o problema. Confira:

A FAVOR
Juiz Evandro Pelarin
Titular da Vara da Infância e Juventude de Fernandópolis e autor do toque de recolher na cidade

“O toque de recolher serve apenas para o recolhimento de crianças e adolescentes em situações de risco – como bebida alcoólica, drogas e prostituição. Em agosto de 2005, quando começou o toque de recolher em Fernandópolis, por dia, chegávamos a recolher das ruas 40 a 50 adolescentes envolvidos diretamente com o álcool, drogas e até prostituição.

Hoje, nas nossas operações, dificilmente recolhemos mais de 10 adolescentes em situação de risco. Na última ronda, realizada nesta sexta (24), recolhemos apenas três”, conta Pelarin.

O juiz admite que a medida é rígida, mas diz que, se ninguém toma uma atitude em relação aos menores que se encontram em situação de risco, o poder público tem que fazer algo. “Nos artigos iniciais do estatuto está escrito que a família, a sociedade, e o poder público devem garantir uma infância e juventude sadia”, afirma.

Após quatro anos do toque de recolher em ação, Pelarin também comentou sobre as melhoras da cidade. “Hoje em dia, observamos uma juventude um pouco mais organizada. Vemos os pais indo para a festa com filhos. A medida acabou estimulando uma presença maior dos pais com os filhos”.

O juiz até comentou sobre a abertura de matinês permitidas apenas menores de idade. “Depois do toque de recolher, surgiram novas opções de lazer; a própria sociedade foi criando novas opções e comportamentos sadios”, conta.

E para finalizar o bate-papo diz: “Um adolescente não tem total condições de saber o que é certo ou errado ou de decidir sua vida. Depois dos 18 anos, você faz o que quiser da sua vida. Por que eu quero assim? Não, porque está no Estatuto da Criança e do Adolescente”.

CONTRA
Ariel de Castro Alves
Advogado, especialista em direitos humanos e direitos da criança e do adolescente e membro do Conselho Nacional dos direitos da criança e do adolescente

“Sou contra o toque de recolher por vários e inúmeros aspectos. Primeiro porque contraria o direito à liberdade, que está no artigo 227 da Constituição Federal. No Estatuto da Criança e do Adolescente também diz que é crime qualquer autoridade privar crianças ou adolescentes de suas liberdades, procedendo a sua apreensão sem estarem em flagrante ou inexistindo uma ordem prescrita da autoridade judiciária, só pode ser prescrita após uma declaração”, diz o especialista.

“É necessário analisar caso a caso. O Conselho Tutelar aplica medidas de proteção específicas, a polícia não tem competência para resolver o problema e tem crimes mais graves para resolver. O toque de recolher também é uma atitude esporádica e o que precisamos é de algo permanente, de uma orientação e de programas sociais voltados para esses jovens.

Obrigar o adolescente ficar dentro de casa, não vai fazer o problema ser resolvido. Mas quem quer beber ou usar drogas, sempre arruma uma forma de se virar. O que precisa é de programas públicos com resultado permanente. Estar dentro de casa não quer dizer que o adolescente está livre da violência

Se alguns pais não conseguem estabelecer limite, devem reconhecer sua incompetência e procurar o Conselho Tutelar ou a Vara da Criança e da Juventude. O Conselho vai conversar com os pais e orientá-los; chamar o adolescente, encaminhar o jovem para programas sociais ou de apoio psicológico”, afirma Ariel de Castro Alves.

Além do mais, o especialista em direito das crianças e dos adolescentes lembrou que no Brasil é permitido trabalhar a partir dos 16 anos. “Não dá para generalizar e dizer que todos os jovens que estão na rua se encontram em situação de risco. Depois das 22h o adolescente pode estar voltando da escola ou do trabalho”.

“Por que não vai um grupo de policias na Cracolândia? Lá sim as crianças estão em situação de risco e em qualquer horário”, questiona o advogado.


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BATE/REBATE: Toque de recolher para menores divide a opinião de especialistas