A estrela maior do cinema francês, Isabelle Huppert está no Brasil, segundo ela mesma, pela sexta vez. Apesar das visitas abundantes, pouco conhece o País, “apenas o Rio de Janeiro e Brasília”, e São Paulo, é claro, e menos ainda interage com seu povo. Quem lembra bem das personagens fortes que a atriz interpretou na telona, como Erika Kohut, em A Professora de Piano [que lhe rendeu a Palma de Ouro em Cannes, em 2001], ou Jeanne, em A Cerimônia, pode ter uma vaga noção de sua personalidade fora da tela e dos palcos: uma figura forte, seca e blasé.
Convidada de honra da programação do Ano da França no Brasil, Huppert veio desta vez para encenar a montagem Quartett, uma releitura do romance As Relações Perigosas, de Pierre Choderlos de Laclos, assinada pelo dramaturgo alemão Heiner Müller. São sete apresentações em São Paulo: duas já aconteceram no final de semana, dias 12 e 13, e terá também nos dias 15 e 16 de setembro, no Sesc Pinheiros. Em seguida, a peça vai para Porto Alegre, de 23 a 25 de setembro, no Teatro do SESI. Ainda em São Paulo, a atriz ganha, também, uma homenagem com uma mostra de filmes, vídeos e fotos no Cinesesc, de 11 a 16 de setembro.
Antes da mostra e das encenações, na sexta-feira, dia 11, Huppert conversou com os jornalistas sobre a peça, o cinema e os próximos projetos. Com suas escassas palavras, provou ser a típica atriz que os espectadores devem se limitar (leia-se contentar) a conhecê-la apenas na tela. Sua indiferença às perguntas deixou um ar antipático, mas ao mesmo tempo instigante e charmoso aquele típico francês.
O espectador é quem tem que aguentar
O jeito de professora de piano, indiferente ao seu aluno, apareceu logo de cara ao responder sobre qual diretor gostaria de trabalhar, já que esteve com grandes mestres do gênero. Um olhar irônico e a resposta “não é o tipo de pergunta que gosto de responder. Acho um pouco vazia. Mas, gostaria de ter sido dirigida por Hitchcock (mestre do suspense, morto há 29 anos)”.
Com o humor (negro) peculiar de uma diva, disse ainda que não considera nenhum de seus papéis desafiador. Creio que o desafio maior é do espectador, que tem que aguentar até o final do filme. Geralmente as minhas personagens são agressivas mais por necessidade que por natureza. É um instinto de sobrevivência.
De acordo com ela, atuar é se entregar por inteiro durante o momento. Você perde o domínio da cabeça e do corpo. Há um esforço físico naquilo. Mas os esforços são diferentes no cinema e no teatro. Eu diria que o teatro é subir uma montanha, enquanto que o cinema é fazer um passeio.
Com toda essa propriedade, não seria à toa que a estrela francesa escolhesse seus papéis, tanto no cinema quanto no teatro. Não tenho muitos critérios para aceitar um convite. Mas se tivesse que escolher apenas um, seria o diretor.
A pianista premiada
Sobre seu desempenho em A Professora de Piano (2001), Isabelle revelou que não houve preparação. Você não prepara um papel, você entra nele. Segundo ela, o convite para o filme surgiu depois que ela recusou a participação em Violência Gratuita (1997).
Michael Haneke me procurou para fazer o filme, mas tive medo. Então criou uma personagem pra mim. E como já tinha afinidade com o piano, já que estudei quando era mais nova, aceitei a proposta, comentou.
Junto com seu prêmio de Melhor Desempenho Feminino, A Professora de Piano recebeu outros dois em Cannes: o Grande Prêmio do Júri e o prêmio de Melhor Desempenho Masculino, para Benoit Magimel.
De candidata à presidente em Cannes
Isabelle Huppert foi escolhida para presidir o júri do festival de Cannes em 2009. Na época, considerou o convite uma honra à sua ligação afetuosa com o evento, já que foi premiada duas vezes pelo já citado filme de Haneke e por seu papel em Violette Nozière, além de ser agraciada com um prêmio de revelação em Um Amor Tão Frágil, ambos de 1978.
Quando perguntada sobre as dificuldades de presidir o festival, não perdoou. Não houve dilemas. É claro que você escolher um filme significa desistir de outro. A única desvantagem é que já passou. Não vai mais acontecer, alfinetou.
A cultura brasileira
Apesar de ser a sexta vez que vem ao Brasil, Isabelle não conhece muito da cultura local, mas parece flertar com a cinematografia brasileira. Conheço o cinema novo do Glauber Rocha e também gosto dos filmes do Walter Salles, elogiou.
Também fiquei sabendo do filme À Deriva, com o Vincent Cassel (seu conterrâneo). Do Heitor Dhalia, não é isso?, complementou. Seu próximo filme, inclusive, se chamará Copacabana. “Apesar de ter esse nome, ele se passa no norte da França”, riu.
Quem sabe um dia veremos a sua classe e frieza características em algum filme com a mãozinha brasileira. É esperar para ver.