Único escritor brasileiro a ser premiado por um livro sobre vampiros, o escritor Kizzy Ysatis decidiu mudar o foco em seu mais novo trabalho: O mistério do Rio das Rosas Brancas (editora Novo Século/ R$29,90). Desta vez, ele aborda em tom lúdico o relacionamento amoroso de um professor solitário e um aluno.
O novo trabalho, que tem como pano de fundo a história de São Sebastião, já ganhou o prêmio de Honra ao Mérito pela União Brasileira de Escritores, deve agradar a comunidade LGBT e incomodar políticos e religiosos mais conservadores.
Em entrevista exclusiva ao Virgula Diversão, Kizzy fala sobre Clube dos Imortais (seu primeiro e premiado livro), a mudança de tema, vampiros e adianta detalhes do novo trabalho. Confira:
Você é conhecido com um escritor que aborda o universo dos vampiros. Agora, em O Mistério das Rosas Brancas, decidiu mudar. Por quê?
Na verdade, foi o contrário, os meus primeiros contos não foram sobre vampiros, foram sobre arte homoerótica. Baseado em Sade, escrevi os chamados Contos Proibidos do Marquês de Ysatis, que era basicamente contos eróticos. Levei para os amigos verem em um bar, eles adoraram e acabou virando uma série. Isso é o que a Lygia Fagundes Telles chama de jovialidades, que a gente usa para aprender. O embrião dos livros sobre vampiros surgiu em uma viagem à Espanha e de um sonho que tive com o primeiro personagem da saga…
Era o Luar, o vampiro protagonista do livro Clube dos Imortais?
Primeiramente achei que era Lestat (vampiro criado pela escritora norte-americana Anne Rice), porque ele era loiro imponente, arrogante, nariz liso, reto. Mas uma amiga perguntou: “E os olhos? Eram azuis?”. Não, eram pretos, escuros. “E os cabelos?”. Eram iguais ao da Cher (risos). Ou seja, não era o Lestat. A partir desse sonho comecei a desenvolver o personagem Luar…
Você desenvolveu, ganhou o prêmio Rachel de Queiroz, deu entrevistas e, agora, decidiu mudar completamente. Acha que o tempo dos vampiros já chegou ao fim?
Não existe tema batido, existem histórias mal escritas. Escrevo sobre aquilo que conhece e sobre vampiros eu já escrevi muito bem. É um tema que tem um acesso muito fácil aos jovens, aos autores que escrevem seus primeiros livros. O Stephen King começou escrevendo livro de vampiros e depois foi mudando. É algo natural para um autor.
Quando e como começou a escrever O Mistério do Rio das Rosas Brancas?
Começou em 2006, logo depois que eu assisti o filme Meninos Não Choram (longa de 1999 que aborda a vida de um transhomem), triste, horroroso, tocante. E, apesar de gostar das histórias que lembram Romeu e Julieta, quando o amor é interrompido, comecei a ver que romances gays sempre terminavam mal. Vejo como uma mensagem subliminar, eles só aceitam roteiros em que os gays não terminam juntos. Então já conto logo de cara que o final vai ser feliz, porque, embora seja feliz, há quem sofra, há quem morra, como em toda boa história.
Conte um pouco sobre o personagem principal de O Rio das Rosas Brancas…
O personagem principal é o professor de biologia Luiz Caetano, que vive em um mundo sem cores, solitário. Ele vive em uma casa como as de Tim Burton, pequenininha, cercada por dois prédios. Seus porta-retratos não têm foto e seu peixe não tem nome. Até que ele começa a ter vários pesadelos recorrentes de um trauma e conhece um aluno, que se diz apaixonado por ele. Ele fica surpreso, mas ao mesmo vê sua vida se encher de cor, pois esse menino é ativista, questiona os valores, os políticos…
E onde entra a questão lúdica que é comum nos seus livros?
Em São Sebastião e no Rio das Rosas Brancas. Esse professor vai se despedir do rio, porque será construída uma hidrelétrica. Em cima do penhasco, ele se apoia em uma roseira, que é o tronco onde São Sebastião foi amarrado para levar as flechas, e cai no rio. Detalhe, a árvore é o próprio São Sebastião – olha o spoiller (risos). Só posso contar até aí.
Tem um pouco de você em algum desses personagens?
Ah, claro. O escritor é nenhum personagem e todos ao mesmo tempo. Coloco um pouco de mim, um pouco das pessoas em volta, um pouco do que você cria, uma situação… Sempre fui ativista, mas agora estou mais.
Por abordar temas religiosos, seu livro deve incomodar as igrejas? Tem algum receio?
Deve incomodar a religião, os políticos… Até a Igreja católica, pois escrevo que São Sebastião – conhecido como o padroeiro dos gays – nem queria ser um mártir, que o rapaz que ele gostava é que queria convertê-lo. Mas vamos ver… Tomara que haja bastante crítica sobre meu livro, não tenho nenhum receio. Até porque na Espanha, eles queimaram 20 livros de Allan Kardec e, depois, vendeu mais 400 mil.