of Montreal
O of Montreal é o projeto musical de um homem só. Ou melhor; é o projeto musical de vários homens dentro de um só: o norte-americano Kevin Barnes, vocalista, multi-instrumentista e principal compositor do grupo, que volta ao Brasil nesta semana para shows em São Paulo, nesta terça-feira (26), e no Rio de Janeiro, na quinta-feira (28).
Em entrevista por telefone ao Virgula Música, Barnes é simpático, atencioso e bem-humorado. Fã declarado da nossa MPB, ele aproveita o breve período sabático entre o lançamento do álbum Paralytic Stalks – o 12º da banda – e o início da turnê sulamericana para analisar o impacto da trajetória que o grupo que fundou teve nele mesmo.
“Eu descobri muito sobre mim através da música”, disserta o prolífico compositor ao tentar explicar o rumo semi-contraditório de sua trajetória. Sempre disposto a experimentar e a contradizer decisões anteriores, Barnes incorpora uma evidente confusão entre criador e criatura; entre ele e o líder solitário do of Montreal.
Longe dos palcos, Barnes é o exato meio-termo entre os dois polos marcantes de sua personalidade. Apesar da voz suave, quase sussurrada, em momento algum ele lembra a inocência sofrida do disco de estreia, Cherry Peel (1997), mas também se distancia do frontman caricato, quase carnavalesco, dos anos seguintes.
Casado com uma artista plástica e pai de uma filha de 7 anos, Barnes não hesita em brincar com a própria sexualidade em cima dos palcos. É apenas uma das formas que encontrou para instigar plateias ao redor do mundo; um experimento cultural que provoca milhares de fãs todos os anos, com o objetivo constante de questionar ninguém além dele mesmo.
Virgula Música: As faixas de seu novo álbum, Paralytic Stalks, são muito mais sombrias que as músicas alegres em False Priest (2008), álbum em que você admitiu ter tentado soar mais comercial. Paralytic Stalks é, intencionalmente, uma resposta direta a isso?
Kevin Barnes: De certa forma, sim. Eu gosto muito de música pop, e o que eu tentei fazer em False Priest foi gravar um bom álbum pop. Com Paralytic Stalks eu não quis me preocupar com isso, com o rádio, se as pessoas iriam gostar ou não. Eu só queria fazer algo artisticamente satisfatório. Queria fazer algo que talvez dividisse um pouco as pessoas, porque sendo um artista, você precisa se arriscar. Você não pode se preocupar com o público, com os críticos, com nada disso.
VM: Neste álbum, você se abriu muito mais em relação aos problemas que você e sua família enfrentaram com a depressão. Por que decidiu se abrir tanto desta vez?
KB: Acho que foi algo que me atraiu naturalmente, porque eu passava por um momento difícil [na época em que Paralytic Stalks foi composto]. Eu estava em um período depressivo, e em vez de me deleitar naquela tristeza, naquela melancolia, tentei encontrar um jeito de superar aquilo e talvez até ajudar outras pessoas ao mesmo tempo. Se eu faço algo tão íntimo e enfrento essas questões, outras pessoas terão que fazer o mesmo, e talvez fiquemos mais saudáveis juntos.
VM: Paralytic Stalks possui arranjos bem complexos, com instrumentos que vocês não costumam usar ao vivo. Como vocês vão traduzir esses arranjos para os shows no Brasil?
KB: Isso é sempre um desafio para nós. Basicamente aceitamos que não será a mesma coisa do álbum, a não ser que tivéssemos um quarteto de cordas conosco, todas aquelas coisas que não temos dinheiro para [levar em turnês]. Mas acho interessante. Quando vou a um show, sempre acho melhor ouvir versões um pouco diferente das originais. De certa forma, elas ganham personalidade própria.
VM: As apresentações ao vivo do of Montreal costumam marcar pelo cuidado com a estética e com os efeitos visuais. O que você preparou para esses shows no Brasil?
KB: Por necessidade, vamos fazer algo completamente novo em toda a turnê sulamericana, algo que nunca fizemos nos Estados Unidos nem na Europa. Estamos indo de avião, então daremos um jeito de levar algumas coisas nas nossas bagagens (risos). Sempre que viajamos para outros países é complicado. Mas somos bem espertos, sempre damos um jeito de pensar em algo novo e diferente do que fizemos antes.
VM: Você passou por várias fases diferentes desde o início do grupo. No começo você era um compositor mais introvertido, e depois se tornou um frontman frenético e animado. O som do of Montreal segue as mudanças na sua personalidade, ou você interpreta diferentes personagens de acordo com a sonoridade da banda?
KB: Eu acho que descobri muito sobre mim mesmo através da música. Naturalmente, eu sou assim, mais quieto e introvertido. Mas quando subo no palco, de alguma forma esse outro lado de mim mesmo aparece e quer pular, quer atrair o público e ser um bom músico. Sempre me divirto muito. Gosto de me fantasiar, é sempre muito libertador nesse sentido. Acho que todo o processo criativo me ajudou a me conhecer melhor.
VM: O que você lembra das sua última passagem pelo Brasil, em 2010?
KB: Foi tudo muito rápido, ficamos apenas quatro ou cinco dias, não me lembro bem. Mas lembre de descer do avião, e ver aquelas árvores, aqueles pássaros, e pensar: “Nossa, estou no Brasil!”. Eu ouço [os artistas da] Tropicália há muito tempo. Sempre gostei muito de Os Mutantes, Caetano Veloso, Gilberto Gil, todas essas pessoas, então estar no Brasil foi como chegar a uma terra santa, ou algo assim. O show em si foi incrível – foi em um festival [a quarta edição do Planeta Terra Festival]. Foi tão bom ver tanta gente, e sentir a energia positiva do público que prometemos para nós mesmos que voltaríamos ao Brasil.
VM: Recentemente, Barack Obama defendeu o casamento gay nos Estados Unidos. Como você vê essa questão, e por que você acha que a união homoafetiva tem demorado tanto para ser reconhecida ao redor do mundo?
KB: Cara, eu não sei. Acho que, como espécie, os humanos são muito lentos. Quando Barack Obama [manifestou apoio ao casamento gay], fiquei muito feliz, porque finalmente uma das pessoas mais influentes do mundo declarou apoio a isso, o que, obviamente, é algo bom.
Eu nunca entendi o porquê de as pessoas se oporem ao casamento gay. Não consigo ver como o casamento de outras pessoas pode incomodar alguém. Não tem nada a ver com você, são outras pessoas querendo se casar (risos)! Sempre tive amigos gays, sempre estive aberto a todas essas coisas, e quero que todos explorem a própria sexualidade e sintam-se bem com eles mesmos.
VM: Você acha que o sexo e a sexualidade ainda são tabus para a maioria das pessoas?
KB: Acho que está melhorando. Acho que eventualmente – talvez em uns 20 anos, mais ou menos – ninguém vai se importar tanto com isso, ninguém irá tentar evitar que as pessoas experimentem, aceitem a própria sexualidade, e todos poderão ser o que quiserem ser, quem realmente são. Claro que sempre haverá aquelas pessoas que se irritam com isso, mas espero que elas se tornem a minoria.
Serviço:
POPLOAD GIG 14 com OF MONTREAL
Dia: 26 de junho
Portas: 21h
Shows: 23h
Local: Cine Joia – Praça Carlos Gomes, 82 – Liberdade – São Paulo/SP
Ingressos: 2º lote: R$ 180,00 (inteira) e R$ 90,00 (meia entrada).
Telefone: (11) 3231 3705