Desde o dia 30 de outubro, estava confirmado: pela segunda vez consecutiva teríamos dois brazukas disputando o ATP World Tour Finals, o melhor evento de tênis do mundo. Apenas os 8 melhores jogadores individuais e as 8 melhores duplas se classificam para o torneio. Bruno Soares, 32, e Marcelo Melo, 31, estão disputando esse torneio importantíssimo aqui em Londres. No ano passado, ambos passaram para as semi-finais, mas não conseguiram chegar à grande final.
Bruno Soares e o austríaco Alexander Peya formam a terceira melhor dupla do mundo; já Marcelo Melo e o croata Ivan Dodig estão na 7ª colocação do ranking da ATP. Com a agenda apertada, tive apenas 20 minutos para conversar com os dois mineiros. Com muita simpatia, fui recebido pelos dois na recepção do hotel, onde trocamos uma baita ideia bacana.
Decisão pelo tênis
Nascidos em Belo Horizonte com apenas um ano de diferença, o início de carreira dos dois foi bem parecido. Ambos começaram no juvenil do Minas Tênis Clube, onde se destacaram logo no juvenil. “Mais ou menos com uns 16 anos eu comecei a jogar torneios mais importantes, torneios internacionais, e comecei a ver que eu realmente tava no nível da turma que jogava bem. Eu conseguia ser competitivo com os melhores europeus, melhores americanos”, comentou Bruno. Aliás, ele teve que tomar uma decisão muito difícil logo no começo de sua carreira: ir para uma universidade nos Estados Unidos ou tentar se profissionalizar direto. Felizmente para o Brasil, ele decidiu se profissionalizar direto.
“Pra mim foi quase o mesmo. A partir de uns 14, 15 anos o processo é quase o mesmo pra todo mundo. Você vai jogando os campeonatos brasileiros, depois você passa a jogar os profissionais. E você tendo resultado, você acaba tentando continuar na carreira profissional”, falou o Marcelo.
Dificuldades
Apesar de movimentar muita grana, o tênis nunca teve um grande incentivo no Brasil por parte da federação. “No nosso tempo tinha menos do que hoje, a confederação não era tão estruturada como ela é hoje. Quando você sai do juvenil e vai pro profissional você precisa ter um apoio em todas as áreas: treinador, preparador físico, acompanhamento nos torneios”, explica Marcelo. Isso também mostra o porquê do tênis no Brasil ser tão elitizado. Fora em ações sociais, as pessoas mais pobres ficam muito afastadas do esporte porque não têm condições de se bancar – e a federação pouco ajuda. Ao contrário do futebol, que só precisa de uma chuteira com fita isolante e o dom pro garoto dar certo (por isso temos tantos craques), o tênis precisa de muita ajuda financeira para o atleta se dar bem. “Como o Brasil é muito longe [dos torneios internacionais], a gente tá sempre viajando”, completa Marcelo.
Mesmo tendo melhorado muito, a estrutura ainda não é suficiente. Como diz Soares, “o momento é menos difícil”. Para ele, antes da “Era Guga”, a federação não apoiava em nada. “Naquela época a federação era um zero à esquerda!”, diz o tenista.
A culpa não é só da federação
Preciso admitir, porém, que a culpa não totalmente da CBT (Confederação Brasileira de Tênis). A mídia tem grande culpa nessa falta de incentivo ao tênis. Quantas matérias sobre esses dois craques vocês viram na televisão, no rádio ou em qualquer site? Com certeza muito menos do que eles mereciam. Aliás, sem contar o Guga, quantos tenistas brasileiros você conhece? Pois é.
“Não é só no tênis, não. Em qualquer esporte, pro brasileiro só interessa quem é campeão ou não. É difícil mudar uma cultura dessa num país inteiro”, disse o Marcelo. Nesse meio tempo, Bruno Soares ganhou “apenas” 18 títulos, e Marcelo outros 13. Juntos, eles chegaram a 35 finais. É muita coisa.
“Vou pegar meu exemplo, quando fui pra final de Wimbledon. Lógico que até chegar lá sai muita coisa, mas do perder pro ganhar muda muita coisa. Pô, chegou na final de Wimbledon! Mas para muitos parece que chegar na final e sair na terceira rodada é a mesma coisa”, desabafa Melo.
“Se ele ganha Wimbledon, ele tá no Jornal Nacional, no Fantástico, ele tá em tudo quanto é mídia fora do tênis. Ah, mas ele foi vice – que é um puta resultado – só saiu no mundo do tênis”, complementa Bruno.
Importância do Guga
“Acho todo brasileiro, todo tenista daquela época, tem o Guga como ídolo. Por tudo que ele fez, por tudo que ele conquistou, acho que é natural a gente ter ele como ídolo”, resume Marcelo.
Gustavo Kuerten realmente foi de grande importância para o nosso tênis. Se você é mais novinho, vai lembrar de vê-lo na televisão todo dia, mesmo sem entender que raio de esporte era aquele. Se é mais velho, vai saber como ele foi fora de série. “O Guga transformou toda aquela crença que o pessoal tinha no tênis e mostrou que era possível ir muito mais longe do que o pessoal imaginava”, diz Bruno.
Se o esporte é minimamente conhecido hoje no país, foi graças ao Guga. Quando chegou ao posto de melhor do mundo, em 2000, o esporte teve uma explosão no país. Virou febre. A “Era Guga” foi muito importante e muito grande, mas foi mal aproveitada, como explica Bruno Soares. Segundo ele, o Guga trazia tudo: mídia, verba, patrocínio, tudo que o tênis precisava. Mas como quem capitalizava tudo era uma confederação muito mal preparada, todas essas oportunidades de crescimento foram perdidas. “A Era Guga serviu para a criançada começar a jogar, pro pessoal conhecer, mas depois voltou a ser apenas o sucesso individual”, conclui Bruno.
Recado para a molecada que quer jogar
Bruno Soares (desclassificado, infelizmente, pelos irmãos Bryan na última sexta-feira, 14): “Pratiquem o esporte, pra fazer isso que a gente faz você tem que gostar muito, tem que abrir mão de muita coisa. Tenha consciência que é uma coisa que você está disposto a fazer. Se você quiser ser um jogador de tênis, você vai ter que se esforçar demais e abrir mão de muita coisa, ainda mais numa idade que você não tem muita noção do porquê disso aí. O caminho é longo, tenha paciência. Vitórias e derrotas fazem parte, lesões também. As frustrações fazem parte, mas se vocês querem continuem jogando e batalhando uma hora vocês chegam.
Marcelo Melo (classificado com uma rodada de antecedência para as semifinais): “O principal é desfrutar do tênis, gostar do tênis. Às vezes muita gente não acredita, mas é uma vida dura de ficar fora, viajando. É lógico que tem seu lado bom, mas é muito duro. Você perde muita coisa da juventude, você perde coisas que as pessoas que ficam em casa normalmente não perdem. O início do processo tem que ser muito natural, não forçar e se divertir. As coisas vão fluindo de uma maneira melhor, como foi no nosso caso. A gente sempre gostou muito de jogar tênis, e isso que a gente sempre leva pra criançada. No início não precisa ser nada sério, senão não funciona muito bem.
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